(Ulisses Capozzoli - Scientific American Brasil) O terremoto de magnitude 7.0 que atingiu o Haiti ontem e provocou um número ainda desconhecido de mortos, além de prejuízos materiais, é uma evidência da impotência da ciência em prever acidentes naturais e assim evitar perdas humanas e econômicas.
Avalanches de neve, por exemplo, nos países de clima frio, podem ser provocadas artificialmente por bombardeios de canhões adaptados para esse fim, ou deflagradas com explosão de cargas de dinamite. Com isso evita-se que ameacem vidas e instalações humanas.
Os deslizamentos de encostas, em regiões tropicais e com chuvas pesadas e, especialmente no verão, podem ser estimados por estudos feitos por geólogos e outros especialistas em ciências da Terra.
Terremotos ou sismos, no entanto, são sempre uma surpresa dura e desastrosa.
É possível descrever situações prováveis de um terremoto analisando-se a tensão acumulada nas bordas de placas tectônicas, mas prever o momento em que a energia será liberada sob a forma de tremores, no entanto, é um desafio complexo e ainda não vencido pelo mente e engenhosidade humanas.
Tremores podem ocorrer mesmo em áreas incomuns, no centro das chamadas placas tectônicas, as balsas rochosas em que se divide a litosfera, superfície do planeta sob os nossos pés onde tudo, aparentemente, é sólido e estável.
Falhas geológicas, como as que existem em regiões como a cidade de Poços de Caldas e São João da Boa Vista, entre o sul de Minas e o leste do Estado de São Paulo, por exemplo, podem produzir, em processos de reacomodação geológica, tremores de magnitude incomuns nos centros de placas tectônicas como a Sul Americana.
No caso do Haiti, tremores podem ocorrer, e de fato ocorrem, periodicamente como resultado da interação de um conjunto de placas, todas elas em movimento e não necessariamente na mesma direção.
A Placa do Caribe, sobre a qual está assentado o Haiti, é uma peça pequena numa estrutura que parece a casca quebrada de um ovo cozido.
A Placa do Caribe é sistematicamente prensada num conjunto de forças que envolve a Placa Norte Americana, ao norte/nordeste; a Placa do Pacífico, a Noroeste; a Placa de Cocos, a oeste; a Placa Africana, no leste; e a Placa Sul Americana, ao sul.
Todas essas placas estão em deslocamento, entre outros mecanismos, pelo processo de convecção com origem no coração metálico e quente da Terra.
O calor que funde metais como o ferro e níquel, entre outros, no centro da Terra, é tanto remanescente da bola de fogo que a Terra foi na fase de sua criação, quanto resultado de energia liberada por elementos radioativos, como o urânio, no corpo do planeta.
Essa mesma estrutura metálica em movimento no centro da Terra também é a fonte do campo magnético que protege as formas de vida do planeta de radiação cósmica, especialmente das partículas liberadas pelo vento solar, mais abundantes nos momentos de intensidade de explosões solares, com ciclo médio de 11 anos.
Isso significa que a vida se equilibra sempre entre situações extremas com a determinação que lhe é própria, embora, aparentemente, esteja sempre ameaçada.
Num momento em que o catastrofismo parece espalhar-se por todo o planeta, resultado de visões religiosas obscurantistas, caos econômico seguido de desemprego e outras formas de sofrimento social, além de percepção de dados ambientais produzidos, em boa parte dos casos, por atividades humanas, tremores de terra podem acenar com a visão de fim do mundo.
A verdade, no entanto, está muito distante disso, ainda que exija um olhar tanto mais amplo quanto profundo para ser apreendida.
A Terra é um planeta geologicamente vivo, por isso apresenta processos como sismos e vulcanismo. Com isso recicla, na atmosfera, gases de efeito estufa como o dióxido de carbono que mantém a Terra aquecida e apropriada para a vida como a conhecemos.
O acúmulo de CO2, entre outros que produzem efeito estufa, desde o início da Revolução Industrial, integra outra discussão, mais específica e restrita no tempo.
Se estivesse geologicamente morta a Terra poderia ser um mundo parecido com Marte, muito mais frio e talvez inóspito para formas mais complexas de vida.
Não só na Terra, mas também no céu, fenômenos aparentemente violentos e destruidores estão intimamente ligados à vida.
É o caso das estrelas supernovas que terminam suas vidas em colossais explosões, capazes de abalar a estrutura do espaço-tempo como uma pedra atirada na superfície de um pequeno lago tranquilo.
Material liberado por essas estrelas, no entanto, são fundamentais para a estruturação de outros sóis, planetas e vida, no ciclo ininterrupto de transformações do Comos.
A curta distância, a olho nu e sob a emoção forte que se apossa de quem observa os danos que um sismo produz, tudo pode parecer apenas destruição. Por trás disso, no entanto, a vida pulsa com a força de um coração cósmico.
Ao menos por enquanto, talvez a maneira mais inteligente, criativa e afetiva que existe de responder a esses desastres naturais, certamente está o de partilhar o aqui e agora com as pessoas que amamos, mesmo aquelas que não conhecemos, mas que por muitos caminhos cruzam as nossas vidas.
A vida de cada um pode apagar-se no segundo seguinte, deixando como evidência apenas memórias e lembranças.
Isso pode parecer óbvio e de fato é. O que não significa que seja devidamente considerado.
A vida como um processo, certamente cósmico e não restrito à Terra, no entanto, continuará pulsando com a força e determinação de uma fonte surpreendente que, para muitos, é identificada como “Deus”.
Outros, menos crentes na possibilidade de uma resposta imediata e inequívoca, enxergam aí o que pode ser chamado de “instância da criação”, seja lá o que isso for.
De qualquer maneira, não se trata de algo menos belo ou menos complexo. E a evidência de que as coisas são assim é a própria vida.
Em sua beleza e determinação.
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