24 de jan. de 2012

A Matemática ao longo da História - Período Antigo à Idade Média

(Valderi Pacheco dos Santos, Edimar Lia Pontarolo - JC)

Este é o primeiro de uma série de quatro artigos enviados pelos autores para o JC Email. Valderi Pacheco dos Santos é professor de Química na Universidade Estadual do Oeste do Paraná (Unioeste) e Edimar Lia Pontarolo é professora de Matemática no Colégio Estadual Castelo Branco (Toledo PR).

É bem conhecido que a Matemática não surgiu como mágica e sim, surgiu e evoluiu à medida que a capacidade intelectual do homem foi sendo ampliada. Não é à toa que fatos históricos tiveram consequências diretas no desenvolvimento da Matemática. Neste contexto, os homens primitivos, embora não tivessem desenvolvido ainda a Matemática como ferramenta, em algum momento, mesmo que instintivamente, começaram a ter ideia da quantidade das coisas ao seu redor (filhos, animais, objetos).

Alguns milênios mais tarde, durante o período da primeira civilização, na Suméria (por volta de 4000 anos a.C.), com o aumento substancial das atividades cotidianas, o homem passou a sentir necessidade de anotar tais quantidades na forma de riscos (símbolo que representava a quantidade mínima, o um). O próximo passo foi representar essa quantidade mínima com objetos (cones, bastões). Com isso, o homem aprendia a fazer cálculos simples, pois poderia somar e subtrair objetos. Era o surgimento da Aritmética.

Algum tempo depois, na civilização Egípcia, além de usar este número mínimo para contar, o homem descobriu que podia utilizá-lo também para efetuar medidas e, para isso, inventou o Cúbito (unidade mínima de medida). Por este motivo, os Egípcios eram excelência em obras de engenharia.

Pouco mais tarde viria uma civilização ímpar na história da humanidade, a Grécia, que inauguraria uma nova era no conhecimento matemático e seria referência por muitos séculos. Mais precisamente, essa geração de pensadores gregos surgiu em meados do primeiro milênio a.C. e um dos seus muitos feitos foi desenvolver a matemática algébrica (sem números), destacando-se nomes como Pitágoras, Euclides, Eudoxo, Arquimedes, entre outros. Um grande personagem foi Pitágoras (séc. VI a.C.), que acreditava que os números inteiros eram responsáveis pela harmonia das coisas, inclusive da música. Nesse período, ainda não se tinha ideia da possibilidade dos números poderem apresentar infinitas casas decimais (números irracionais). Foi essa a principal causa que motivou conflitos existenciais entre os Pitagóricos. Um deles (Hipaso) teria sido afogado por seus companheiros quando comprovara que nem mesmo o famoso triângulo retângulo de Pitágoras tinha uma relação de números inteiros entre seus lados.

Outro grande nome da Matemática grega foi Eudoxo (séc. IV a.C.), que deduziu fórmulas para calcular o volume de cones e pirâmides e desenvolveu uma teoria que incluía os números irracionais, que tanto tinham aterrorizado os pitagóricos. Eudoxo aventurava-se também na Astronomia, em que foi o responsável pela descoberta de que o ano não tinha somente 365 dias, mas 365 dias e 6 horas, bem como foi o idealizador de que os astros giravam entorno da Terra presos a esferas celestes transparentes, modelo que influenciaria outros pensadores, entre eles Aristóteles (séc. IV a.C.), a partir do qual, a ideia de que a Terra era o centro do cosmo perduraria por cerca de dois milênios e influenciaria fortemente a Europa durante o período medieval. Outro matemático grego foi Arquimedes (séc. III a.C.), que apesar de ser essencialmente um estudioso da Física, deixou importantes contribuições à Matemática, entre elas a geometria, os números irracionais, o número p, entre outros.

Isso sem falar em Euclides (séc. III a.C.), o qual se interessava pela busca dos padrões matemáticos de beleza, tendo observado que existia uma relação entre estética e a proporção entre dois segmentos igual a 1,618034... Este número irracional ficou conhecido como Razão Áurea e mais tarde (séc. XIII d.C.) revelou-se também na razão entre dois números subsequentes da famosa sequência numérica de Fibonacci: 1, 1, 2, 3, 5, 8, 13, 21, 34, 55..., mostrando ser o padrão utilizado pela estética da Natureza, desde a estrutura espiral de conchas e flores até o crescimento populacional de coelhos. Além disso, Euclides, como um enciclopedista, reuniu todo o conhecimento matemático da época em uma coleção de livros (Os Elementos) que se tornaria referência até muitos séculos depois, nos quais propõe postulados e axiomas que seriam o alicerce fundamental da geometria e da matemática.

Entretanto, nem sempre a História foi muito generosa com a Matemática. Pouco tempo depois, os Gregos sucumbiram à ascensão e ao poderio bélico dos Romanos. Em uma dessas incursões, Arquimedes chegou a ser morto por um soldado romano. A história conta que, distraído com seus cálculos, ele teria sido morto sem oferecer resistência alguma. Apesar de os Romanos absorverem muito da cultura grega, levando-a adiante, não se interessavam pela matemática teórica e misteriosa dos Gregos. Não é à toa que não há nenhum grande nome na História entre os matemáticos romanos. Acumuladores de poder, os Romanos utilizavam a Matemática quase que exclusivamente para contabilizar (riquezas, povos dominados, impostos), desenvolvendo para isso um sistema numérico complicado, os algarismos romanos.

Alguns séculos mais tarde, após a queda de Roma (séc. V d.C.), a Europa Medieval sofreria um profundo atraso em relação às Ciências e principalmente em relação à Matemática, pois herdara o sistema numérico complicado e pouco eficaz dos Romanos. Um marco histórico precursor desse período é o incêndio da biblioteca de Alexandria (391 d.C.), local onde estavam reunidas muitas obras clássicas dos gregos sobre matemática, filosofia e outras ciências; e o assassinato de Hipacia, uma matemática erudita de Alexandria, por fanáticos religiosos em 415 d.C.

Por outro lado, para a sorte da Matemática, os locais que resistiram ao domínio Romano, principalmente a Ásia Menor e a Índia, hoje sob influência principalmente islâmica, mantiveram o bom hábito de traduzir obras clássicas dos pensadores gregos para sua língua, o árabe. Entre os matemáticos do oriente, destacam-se os indianos: Brahmagupta (séc. VII d.C.), que foi o precursor da ideia de utilização do zero em operações matemáticas, bem como de um sistema de notação em matemática semelhante ao que se tornaria o x e o y na metodologia desenvolvida por Descartes cerca de mil anos mais tarde; e Bhaskara II (séc. XII d.C.), introdutor do conceito de infinito e de infinitesimalmente pequeno, que são as bases do cálculo diferencial e integral, desenvolvido formalmente como ferramenta matemática por Newton e Leibniz somente no século XVII. Outro nome de extrema importância na Matemática do oriente é Al Khwarizmi (séc. VII d.C.), autor de uma importante obra que catalogava o uso sistemático dos algarismos indo-arábicos na matemática, bem como inventor de uma metodologia revolucionária de comprovação matemática sem o uso de números, denominada Álgebra.

Foram exatamente estes locais que o matemático italiano Leonardo de Pisa, conhecido como Fibonacci, visitou durante a Idade Média (séc. XII e XIII d.C.) e sofreu influência principalmente do sistema numérico e das muitas operações matemáticas desenvolvidas pelos árabes, como conseqüência da própria versatilidade de seus algarismos, os indo-arábicos. Fibonacci introduziu os novos algarismos na Europa em 1202, em sua obra intitulada Liber Abbacci (Livro dos Cálculos), bem como demonstrou operações matemáticas básicas com os novos algarismos, que são utilizadas até hoje por professores para ensinar Matemática. No princípio, os novos algarismos trazidos por Fibonacci causaram desconfiança, devido à sua versatilidade e rapidez na execução dos cálculos em relação aos tradicionais ábacos, sob a alegação de que seriam mais suscetíveis a manipulações e fraudes, mas não demorou muito para que fossem adotados e tivessem seu uso popularizado. Este, claro, é só mais um entre os vários aspectos motivadores do surgimento de grandes matemáticos na Europa nos próximos séculos, os quais seriam inspiradores ou protagonistas da Revolução Científica do século XVII.

Referências:
1. CARL B. BOYER, História da Matemática, 3ª Ed, São Paulo: Edgard Blucher, 2010.
2. LEONARD MLODINOW, A Janela de Euclides - a história da geometria, das linhas paralelas ao hiperespaço, São Paulo: Geração Editorial, 2010.
3. REVISTA GALILEU, Eureka - A matemática divertida e emocionante, Ed. Especial, São Paulo: Globo, 2003.

Sugestões de Vídeos:
1. MARCUS DU SAUTOY, The Story of Maths, BBC Four, 2008.
2. TERRY JONES, The Story of One, BBC, 2005.

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