16 de mai. de 2012

Campinas: Saída de astrônomo gera mobilização

Comunidade científica do Estado critica a exoneração do professor Orlando Ferreira do observatório

(Correio Popular) A exoneração do professor Orlando Rodrigues Ferreira do cargo de coordenador do Observatório Municipal de Campinas Jean Nicolini, publicada anteontem, mobilizou a comunidade científica de todo o Estado de São Paulo. Pesquisadores e cientistas ligados à astronomia chegaram a fazer manifesto em repúdio à decisão do secretário Municipal de Cultura, Flávio Sanna. A justificativa da pasta é de que a exoneração se trata de uma mudança administrativa. Por enquanto, ninguém será nomeado para o cargo. Ferreira estava à frente do local desde 2006, mas sua relação com o a astronomia e com a instituição completa 30 anos este ano. Ele disse que já esperava a decisão, mas lamentou a forma como a sua saída foi conduzida. “Sequer fui convidado para uma conversa com a administração e, principalmente, pelo senhor secretário de Cultura que, por essa postura, demonstrou deselegância, mandou simplesmente uma querida colega servidora comunicar-me oficialmente na sextafeira”, disse.

Algumas das preocupações do astrônomo, enquanto esteve na coordenação do observatório, eram com a divulgação da ciência, com a aproximação das pessoas da
astronomia e valorização dos profissionais da área. “Procuramos manter o público e a
imprensa sempre informados das atividades do observatório e dos fenômenos astronômicos. Grupos de estudantes e pesquisadores realizaram intercâmbios no sítio astronômico e procuramos trazer os próprios servidores da Prefeitura para conhecer nossos trabalhos, pois muitos sequer haviam conhecido o espaço.”

Pesquisadores de todo o Estado demonstraram insatisfação com a exoneração. O
professor de astronomia e coordenador geral do Observatório de Diadema, Oscar Luís Ferle, fez um manifesto de repúdio contra a decisão do secretário. Segundo ele,
nos últimos anos em que Ferreira esteve à frente do Observatório de Campinas, “com atitudes simples e objetivas e muita dedicação”, foram restabelecidos o prestígio da instituição, a regularidade e a qualidade do atendimento. “Resta lastimar pela desconstrução da ciência, educação e cultura imposta em Campinas pelo poder municipal, resultante do excesso de políticos e da falta de administradores públicos que visem, como deveria ser, o bem da comunidade e não dos apadrinhados de ocasião”, afirma em seu manifesto. “Ao astrônomo, educador e cidadão Orlando Rodrigues Ferreira, o inconteste apoio da comunidade astronômica brasileira, cuja recondução ao cargo se espera o mais brevemente possível, reparando assim o crasso erro administrativo cometido”, cita o manifesto.

O astrônomo titular do Observatório do Capricórnio, José Victor Rodrigues Júnior, disse que a exoneração afeta uma área carente de entidades e profissionais. “O Observatório era um centro de análise e pesquisa e recebia o público e escolas para dar suporte auxiliar na educação. Remover alguém do gabarito do professor Orlando por uma conveniência política não significa simplesmente a perda para o cargo, mas uma perda literal para a equipe operacional, para a pesquisa e divulgação científica”, afirma.

Professor de pós-graduação em astronomia da Universidade Cruzeiro do Sul e professor associado do Planetário do Ibirapuera, Paulo Leme, também lamentou a exoneração.

Segundo ele, Orlando Ferreira restaurou a credibilidade do Observatório de Campinas no meio astronômico, acadêmico e educacional. “O professor Orlando tem uma longa história de competência profissional no observatório de Campinas. A comunidade astronômica brasileira está de luto com a sua saída da instituição”, disse.

Com a voz embargada, Ferreira disse que ficou surpreso com a repercussão de sua exoneração no meio astronômico e acadêmico, além das escolas e pessoas que recebeu
no observatório.

“Minha caixa postal lotou de mensagens de apoio e protesto contra a Administração municipal, mas, neste instante, peço serenidade a todos. Sinto-me lisonjeado e a minha maneira de agradecer é continuando meu trabalho seja aonde for, seguindo constantemente sob a égide de Urânia e de Jean Nicolini”, disse.

Sanna
O secretário de Cultura, Flávio Sanna, por meio de sua assessoria de imprensa, informou que a decisão faz parte de uma série de mudanças que vem fazendo na pasta.

Informou que o trabalho desenvolvido por Ferreira será dividido entre os três astrônomos que ficaram.

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Entrevista de Orlando Rodrigues Ferreira ao Correio Popular:

O senhor já esperava essa decisão em meio à movimentação de secretários na Prefeitura de Campinas?
ORF: Fiquei sabendo antecipadamente da minha possível exoneração em meados de abril, mas somente por intermédio de colegas na Prefeitura e não citarei nomes por motivos óbvios. Sequer fui convidado para uma conversa com a administração e, principalmente, pelo senhor secretário de Cultura que, por essa postura, demonstrou deselegância — mandou simplesmente uma querida colega servidora, muito constrangida, me comunicar oficialmente na sexta-feira, 11 —, mas acredito que ele deve possuir outras virtudes e auguro que as cultive.

Há quanto tempo o senhor estava à frente do observatório municipal?
ORF: Meu retorno ao OMCJN ocorreu em novembro de 2006, porém, minha relação com a Astronomia e a instituição completa 30 anos neste 2012. Passei por outras administrações, sendo que, de todas, sempre tive o mais elevado reconhecimento e respeito. Não sou filiado a qualquer partido político — e nem pretendo filiar-me —, ou melhor, meus partidos chamam-se CAMPINAS e BRASIL.

Como o senhor recebeu essa exoneração? O senhor se preocupa com o futuro do observatório? Por exemplo, com o nível de conhecimento e envolvimento da pessoa que ocupará a função do senhor? 
ORF: Não me abalo com a exoneração, não sou funcionário de carreira da Prefeitura e, se estava no OMCJN durante todos esses anos, penso que era por competência técnica e nível de formação. Unicamente lastimo como o processo descortês da exoneração ocorreu, assim também como
aconteceu com outros colegas. Logicamente me preocupo com o futuro do OMCJN e de seus servidores, por isso, almejo que seja conduzida ao cargo uma pessoa com formação técnica e experiência administrativa. Somente lamentarei se for nomeado alguém por simples indicação política ou que, além de não ter perfil administrativo, não possua relacionamento com a Astronomia e ciências; preferencialmente considero que deve possuir formação superior, pois significativa parte do público (mais de 55%) é composta por estudantes e professores de todos os níveis, portanto, o conhecimento e a abordagem pedagógica do ensino de Astronomia e ciências é essencial. A equipe técnica do OMCJN, da qual possuo muito orgulho e amizade, neste momento está reduzida (somente três astrônomos) e, agora, a instituição se encontra ainda mais desfalcada tecnicamente, prejudicando principalmente o atendimento público e escolar. Portanto, permanecerei como fiel defensor, vigilante e interlocutor das causas do OMCJN; saio com a consciência do dever cumprido e desejo à pessoa que assumir consiga atender todas as demandas administrativas, técnicas, educacionais, culturais e científicas, entre outras, do OMCJN, que ainda não foi devidamente prestigiado pela administração recém-empossada, porém, creio que o será no devido momento, até porque o prefeito Dr. Pedro Serafim Jr. é um Homem de Ciência... ao contrário do senhor secretário de Cultura.

O senhor estava me dizendo que nos últimos anos o observatório teve um aumento de público? Aumento de quanto? Ele foi fruto de todo o trabalho da equipe coordenada pelo senhor?
ORF: Quase 14.000 pessoas por ano são atendidas pelo OMCJN, ou seja, é um dos órgãos da Secretaria de Cultura que, proporcionalmente, mais recebe público visitante e com reconhecimento nacional e internacional nas áreas da Astronomia e ciências afins. O aumento de público e Escolas atendidas pelo OMCJN, apesar das dificuldades, foi resultado do trabalho de toda uma equipe, desde o mais humilde servidor ao mais graduado, pois todos são igualmente importantes no processo de engrandecimento da instituição e da construção do conhecimento. O aumento de público deu-se já a partir de 2007, com 8.040 pessoas; 2008, com 7.220; 2009, com 16.970, isto devido ao Ano Internacional da Astronomia; 2010, com 13.927; e 2011 (fechando balanço, mas se registrou queda devido à crise em Campinas). Mesmo que seja pouco significativo, equivale entre 2007/2010, em comparação a 2006, um aumento de público de 287,5%, com pico de 424,5% em 2009 e sem aumento da equipe, salários (ressalvando os dissídios) ou maiores custos, ou seja, somente aplicando uma gestão adequada e valorizando o servidor em todos os aspectos, posto que sem o elemento Humano não podemos ter uma visão mais abrangente e real do Universo, seja este exterior ou interior ao Ser.

Como está ou como é visto o observatório hoje em âmbito nacional?
ORF: O OMCJN foi inaugurado em 15/01/1977, pelo astrônomo Jean Nicolini (1922-1991) e o então prefeito Dr. Lauro Péricles Gonçalves, sendo o primeiro Observatório municipal estabelecido no Brasil. Possui reconhecimento em níveis nacional e internacional, com a equipe constantemente realizando contatos e intercâmbios com instituições e pesquisadores do país e exterior. Talvez um medidor da importância da instituição esteja nas mensagens que a própria Imprensa está recebendo em relação à minha saída, assim como também certamente ocorreria se fosse relacionada a qualquer outro membro da equipe.

Professor, foi um trabalho de 30 anos, mas será que o senhor poderiaelencar alguns avanços no Observatório nos últimos anos? Qual era a grande preocupação do senhor enquanto estava à frente do Observatório?
ORF: Procuramos valorizar os servidores e suas capacidades profissionais (eu mesmo fiz cursos de Liderança da Escola de Governo e Desenvolvimento Social [EGDS] da Prefeitura), assim, ultimando oferecer ao público o melhor da Astronomia e dos profissionais da instituição; desenvolvemos eventos internos e procuramos manter o público e a Imprensa sempre informada das atividades do OMCJN e dos fenômenos astronômicos; grupos de pós-graduandos, mestrandos, doutorandos e professores realizaram intercâmbios no sítio astronômico; procuramos trazer os próprios servidores da Prefeitura para conhecer nossos trabalhos, pois muitos sequer haviam conhecido o OMCJN, mesmo sendo este um órgão da administração municipal; algumas reformas entre 2009 e 2011 permitiram a acessibilidade ao OMCJN (estacionamento, sinalização, rampas de acesso, passarelas e sanitários adaptados); participação da equipe em congressos apresentando trabalhos da instituição; aumento do público atendido e muito mais; tudo sempre informado – inclusive os problemas e dificuldades do setor – por relatórios encaminhados à Secretaria de Cultura.

Atualmente, onde o senhor atua ou onde vai atuar?
ORF: Prosseguirei com minhas atividades em Astronomia e ensino de ciências, inclusive retomando alguns projetos, como o Astromóvel - Unidade Volante de Astronomia, Ciência, Educação e Cultura. Além de astrônomo, sou professor licenciado em Filosofia, pós-graduado em Astronomia, com especialização em Estudos de Política e Estratégia; estou concluindo o mestrado em Ensino de Ciências, com projeto voltado à Astronomia e ciências afins para formação continuada de professores e abordagens CTS (Ciência, Tecnologia e Sociedade), possuindo (agora não mais) o OMCJN também como objeto de estudo e pesquisa; estou voluntariamente ministrando um curso de extensão em CTS numa Universidade em São Paulo. Então, prossigo com meus trabalhos, ou como dizia o saudoso presidente Tancredo Neves: “– Para descansar eu tenho a eternidade!”

Muita gente e especialistas na área da astronomia está sentindo a saída do senhor. Inclusive com manifesto de repúdio. 
ORF: Realmente fiquei surpreso com a rápida repercussão no meio astronômico e acadêmico, além das Escolas e pessoas que recebi no OMCJN. Minha caixa postal de correio-e lotou de mensagens de apoio e protesto contra a administração municipal, mas, neste instante, peço serenidade a todos. Sinto-me lisonjeado e a minha maneira de agradecer é continuando meu trabalho seja aonde for, seguindo constantemente sob a égide de Urânia e de Jean Nicolini. Aproveito a oportunidade oferecida pelo Correio Popular para externar minha gratidão e amizade para cada servidor e colaborador da Secretaria de Cultura e da Prefeitura de Campinas, principalmente nominando os amigos da equipe do OMCJN que, por muitos anos, seguiram comigo na mesma nau celeste: Donisete Aparecido da Silva, agente de apoio operacional; Júlio César Ferreira Lobo, astrônomo; Júlio César Penereiro; astrônomo; Walter José Maluf, astrônomo; Adilson Fernandes Dias, técnico de manutenção; Airton José da Cruz, vigia; José Maria da Silva, vigia; Evânio Lima, vigia; e Xisto José da Silva, vigia."

4 comentários:

  1. Já vai tarde. Um parasita a menos na prefeitura.

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    1. Parasita a menos ? Você não leu nada né? O professor que foi dispensado do observatório --'

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    2. Parasita a menos ? Você não leu nada né? O professor que foi dispensado do observatório --'

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  2. Aqueles que pretendem levar mais cultura e conhecimento à população são eliminados.
    É desta maneira que os governantes querem, pois, “povo burro não reage”.
    E assim caminha a humanidade!!!
    Infelizmente não sei para onde, é uma lástima!!!

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