O grande esquema, um trampolim para a teoria de cordas, ainda está no topo da lista de desejos dos físicos. Mas se nenhuma evidência sólida surgir em breve, essa área poderá se tornar um sério problema de relações públicas
(Scientific American Brasil) Há décadas físicos postulam a ideia de um mundo inteiro de sombras de partículas elementares, chamado supersimetria. Ela resolveria de modo elegante os mistérios não explicados pelo atual Modelo Padrão da física de partículas, como a composição da matéria escura cósmica. Agora, alguns começam a se surpreender. O acelerador de partículas mais poderoso, o Large Hadron Collider (LHC), ainda não observou qualquer fenômeno novo que denuncie algum nível invisível da realidade. Embora a pesquisa esteja apenas começando, já levou alguns teóricos a se perguntar o que será da física se a supersimetria se mostrar não verdadeira.
“Onde quer que procuremos nada observamos, isto é, nenhum desvio do Modelo Padrão”, alega Giacomo Polesello do Instituto Nacional de Física Nuclear da Itália, em Pavia. Polesello é um dos líderes da influente equipe internacional de três mil cientistas que construiu e opera o ATLAS, um dos dois detectores genéricos gigantescos no anel do LHC. O CMS, o outro detector, tampouco observou algo, de acordo com uma atualização apresentada em uma conferência nos Alpes italianos, em março passado.
Teóricos apresentaram a supersimetria nos anos 60 para ligar os dois tipos básicos de partículas observados na Natureza, os férmions e os bósons. Basicamente, os férmions são os componentes da matéria (o elétron é um exemplo disso), enquanto os bósons são portadores das forças fundamentais (do fóton, no caso de eletromagnetismo). A supersimetria seria como atribuir a cada bóson conhecido um “superparceiro” pesado, o férmion e, a cada férmion conhecido, um parceiro pesado, um bóson. “É o próximo passo para a visão definitiva do mundo, onde fazemos tudo de forma simétrica e bonita”, descreve Michael Peskin, do National Accelerator Laboratory no SLAC.
O enorme acelerador no Cern, próximo a Genebra, deveria ter energia para produzir essas superpartículas. Atualmente, o LHC esmaga prótons com uma energia de 4 trilhões de elétronvolts (TeV) por vez, a partir das 3,5 TeV do ano passado. Essa energia é dividida entre quarks e glúons, que formam osprótons, para que a colisão possa gerar novas partículas equivalentes a cerca de 1 TeV de massa. Apesar das altas expectativas (e energia), no entanto, a Natureza não cooperou até agora. Físicos do LHC procuram sinais de partículas novas para a ciência e nada encontram. Se as superpartículas existem, deveriam ser ainda mais pesadas que o considerado. “Para ser franco”, desabafa Polesello, “a situação nos fez descartar muitos modelos ‘fáceis’, que deveriam ter aparecido de imediato.” Seu colega Ian Hinchliff e, do Lawrence Berkeley National Laboratory, concorda: “É impressionante observarmos a gama de massas e partículas excluídas”.
Mas muitos físicos mantêm suas esperanças: “Ainda há formas muito viáveis de construir modelos supersimétricos”, sustenta Peskin. Seria irreal esperar uma nova física após apenas um ano de coleta de dados, acrescenta Joseph Lykken, teórico da equipe do CMS.
O que os incomoda, porém, é que para que a supersimetria resolva os problemas para os quais foi desenvolvida, ao menos algumas das superpartículas não deveriam ser muito pesadas. Para compor a matéria escura, por exemplo, é preciso que não pesem pouco mais que décimos de 1 TeV.
Outra razão para a maioria dos físicos desejar que algumas superpartículas sejam leves é o bóson de Higgs, meta também importante do LHC. Supõe-se que todas as partículas elementares com massa têm essa condição assegurada pela interação com este bóson e, secundariamente, com um halo de fugazes “partículas virtuais”. Na maioria dos casos as simetrias do Modelo Padrão garantem que essas partículas virtuais se anulam mutuamente, para pouco contribuírem com a massa. A exceção, ironicamente, é o próprio Higgs. Cálculos baseados no Modelo Padrão produzem o resultado paradoxal de que a massa do bóson deveria ser infinita. Superparceiros resolveriam esse mistério provendo maior razão para cancelamentos. Uma massa do Higgs de cerca de 0,125 TeV, sugerida pelos resultados preliminares anunciados em dezembro passado, estaria correta na faixa prevista pela supersimetria. Neste caso, porém, as superpartículas teriam de ter massa relativamente baixa.
Se não for assim, uma explicação seria que simetrias até então desvalorizadas do Modelo Padrão mantêm a massa do Higgs finita, como Bryan Lynn, da University College London, sugeriu no ano passado. Outros argumentam que, no máximo, a ideia de Lynn daria uma explicação parcial, deixando um papel vital para a física, além do Modelo Padrão — se não a supersimetria, então uma das outras estratégias concebidas por teóricos. Um plano B popular é que o bóson de Higgs não seja uma partícula elementar, mas um composto de outras, a exemplo de prótons, que são formados por quarks. Cristophe Grojean, do Cern, lamenta que o LHC ainda não tenha dados suficientes para contribuir com essa ideia. Opções mais exóticas, como dimensões adicionais do espaço além das três habituais, podem ficar para sempre fora do alcance do LHC. “Neste momento”, compara Gian Francesco Giudice, outro teórico do Cern, “cada teoria tem seus próprios problemas”.
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