(Marcelo Gleiser-Folha) Buracos negros são objetos extremamente estranhos. Imagine uma região do espaço de onde nada pode escapar, nem a luz. Essa é a ideia por trás dos buracos negros, uma consequência da teoria da relatividade geral de Einstein, que diz que a força da gravidade pode ser interpretada como sendo devida à curvatura do espaço em torno de uma massa: quanto maior a massa, mais curvo o espaço e mais intenso o puxão gravitacional.
Einstein nunca foi fã dos buracos negros. E com boa razão. Normalmente, buracos negros são restos de estrelas que gastaram o seu combustível e sucumbem à atração gravitacional de sua própria massa: feito um balão que implode, vão ficando cada vez menores e mais densas, encurvando o espaço cada vez mais à sua volta, até que, no centro de tudo, a gravidade fica infinitamente forte: essa é a singularidade, o ponto onde a teoria de Einstein deixa de funcionar. Einstein e outros achavam que algo deveria ocorrer antes de se chegar na singularidade.
Buracos negros são cercados pelo "horizonte de eventos", que delimita seu poder atrativo: algo que passa de lá não escapa mais. Por outro lado, se alguém cai num buraco negro, não percebe nada ao passar pelo horizonte de eventos, fora a força cada vez maior em direção ao centro. Isso é consequência do chamado princípio de equivalência, de Einstein. Existe, portanto, uma assimetria no buraco negro: caindo, não percebemos o horizonte de eventos, mas, se tentarmos sair de dentro dele, não conseguimos.
Ao menos, essa é a teoria aceita hoje. As coisas complicam quando incluímos a física quântica na descrição dos buracos negros. Stephen Hawking mostrou que a física quântica implica que buracos negros evaporam aos poucos, expelindo parte da matéria de seu interior. Imediatamente, surgem duas questões: se a matéria que cai dentro é organizada (por exemplo, um livro, um sapo), mas escapa apenas como radiação, o que acontece com toda a informação? É perdida? Se for, isso viola a física quântica. E se o buraco negro evaporar totalmente? Ficamos com a singularidade exposta, um ponto absurdo, sem sentido?
A crise põe os dois pilares da física moderna –a física quântica e a relatividade– em pé de guerra. Em 2012, John Polchinski, da Universidade da Califórnia, sugeriu uma solução que piorou as coisas: talvez o horizonte de eventos seja uma espécie de muralha de fogo, devido a todas as partículas que evaporam do buraco negro e perdem contato com suas irmãs no interior. Se a muralha existir, violaria o princípio de equivalência, pois quem passasse por ela saberia onde está o horizonte de eventos. Nesse caso, Einstein estaria errado. A alternativa seria aceitar que informação é perdida quando cai no buraco negro, violando as leis da física quântica.
Para complicar, na semana passada Hawking sugeriu uma solução ainda mais dramática: talvez o horizonte de eventos não exista e seja só um "horizonte aparente". Hawking quer salvar a relatividade e a física quântica abolindo os buracos negros! Por ora, sabemos apenas que a controvérsia seguirá por um bom tempo. Afinal, em jogo estão as duas teorias mais preciosas da física. Será que uma terá que ceder?
Nenhum comentário:
Postar um comentário
Comente