25 de jul. de 2014

Em busca dos porcões do espaço


(Mensageiro Sideral - Folha) Um trio de astrônomos nos Estados Unidos acaba de lançar no ar uma sugestão inusitada: eles querem procurar poluição industrial na atmosfera de outros planetas.

Convenhamos, é uma baita sacada na busca por inteligência extraterrestre. Em vez de somente procurar civilizações que estejam disparando sinais de rádio em nossa direção, como fazem há cinco décadas os entusiastas da SETI, por que não buscamos no ar desses mundos sinais de atividade inteligente? Tomando por base os seres humanos (e se somos inteligentes ou não fica por sua conta), é bem provável que outras civilizações, em algum momento de sua história, poluam a atmosfera de seus planetas, assim como nós fazemos aqui no nosso pálido ponto azul.

Henry Lin, Abraham Loeb e Gonzalo Gonzalez Abad, do Centro Harvard-Smithsonian para Astrofísica, fizeram algumas contas e chegaram à conclusão de que o Telescópio Espacial James Webb — sucessor do Hubble a ser lançado pela Nasa em 2018 — poderia detectar dois tipos de clorofluorocarbonos (conhecidos pela sigla CFC) na atmosfera.

Talvez você se recorde desses compostos. Eles já foram emitidos em grande quantidade pela humanidade (com usos que iam de sprays de desodorante a gases de refrigeração de geladeiras), até descobrirmos que eles destruíam a camada de ozônio da alta atmosfera e interrompermos seu uso desenfreado.

(O sucesso é atribuído ao Protocolo de Montreal, que passou a vigorar em 1989, e conseguiu mobilizar o planeta em torno de uma mudança significativa em sua cultura industrial. Ele é tido como um sinal de que talvez estejamos mesmo nos tornando uma espécie inteligente, afinal. Claro, eu teria mais confiança nessa conclusão caso tivéssemos tido postura similar frente à mudança climática. Até agora, nada.)

E o mais interessante é que os dois tipos detectáveis de CFC têm diferentes tempos de residência na atmosfera. Enquanto um se dissipa em 10 anos caso não seja reabastecido, outro permanece no ar por 50 mil anos. Ou seja, em caso de uma detecção, poderíamos até especular sobre a história particular da civilização em questão. Ela pode ter se extinguido, deixando apenas os compostos de longa duração no ar, ou mesmo interrompido as emissões (como nós fizemos).

A PEGADINHA
Um detalhe que talvez lhe interesse: essa detecção não poderá ser feita em planetas que estejam em torno de estrelas similares ao Sol, em plena atividade. As condições adequadas para a detecção exigem que a estrela do sistema planetário em questão já tenha morrido e, com isso, se transformado numa anã branca.

É o destino do Sol daqui a 5 ou 6 bilhões de anos. Ao esgotar seu combustível para fusão nuclear, ele soprará suas camadas exteriores e restará apenas seu núcleo inativo e ultracompactado pela ação da gravidade, ainda quente por toda a história pregressa, mas se resfriando paulatinamente ao longo de outros vários bilhões de anos. Será basicamente uma bolota muito densa, do tamanho da Terra.

Confesso que, quando li esse pedaço no artigo científico do trio, aceito para publicação no “Astrophysical Journal”, minha primeira reação foi de desânimo. Afinal, estamos tão acostumados com a ideia de que devemos procurar vida em planetas como a Terra, em torno de estrelas como o Sol, que achei um disparate pensar que uma anã branca pudesse ser o melhor lugar para achar os tais “porcões do espaço”.

Contatei Avi Loeb, e ele me convenceu do contrário. “Cerca de um terço de todas as anãs brancas mostram evidências de elementos pesados em sua superfície pela acreção recente de detritos planetários. Algumas são cercadas por discos de poeira, potencialmente pela perturbação de planetas rochosos ou asteroides pela força gravitacional intensa em suas imediações. Essa perturbação aconteceria a distâncias que seriam metade de onde estaria a zona habitável do sistema”, ele me disse. “E temos de ter em mente que planetas foram descobertos em torno de estrelas de nêutrons, que são resultado da explosão violenta de estrelas massivas. Se esses ambientes violentos dão origem a planetas, anãs brancas também poderiam fazê-lo.”

Em suma, ao menos no caso das estrelas, talvez exista vida após a morte. Por isso, o grupo de Loeb já iniciou, em parceria com Dani Maoz, da Universidade de Tel Aviv, uma busca por potenciais alvos — anãs brancas com planetas — que estejam devidamente catalogados quando o Telescópio Espacial James Webb entrar em operação.

Um pensamento particularmente arrepiante é o de que talvez exista uma nova janela de habitabilidade para o Sistema Solar depois que o Sol morrer e se tornar uma anã branca. Será que somos apenas a primeira geração da história da vida por essas redondezas? Avi Loeb certamente acredita nessa possibilidade. “Podemos encontrar vida em lugares inesperados.”
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E mais:
Estamos sós no universo? Poluição extraterrestre pode dar a resposta (UOL), com matérias similares no O Globo e Exame
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Vida Fora da Terra II – A missão (Fundação Planetário)

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