29 de mai. de 2009

10 anos de "Onde a Luz Fez a Curva"

HQ sobre o eclipse em Sobral, em 1919




(O Povo) Hoje, 29 de maio de 2009, é um dia muito importante para o Ceará. E nem todo cearense sabe disso. Hoje, há exatos 90 anos, uma expedição científica do Brasil, da Inglaterra e dos Estados Unidos foi até a cidade de Sobral, no Norte do Estado, para comprovar a Teoria da Relatividade de Albert Einstein, a partir do eclipse solar ocorrido naquela data. Sobral foi escolhida como um dos dois melhores locais do mundo para observar o fenômeno. O outro era na Ilha do Príncipe, na África, mas o mau tempo não ofereceu as melhores condições para os cientistas, fazendo do material coletado em Sobral o mais relevante para a comprovação da teoria de Einstein.

Bem, mas o que tudo isso tem que ver com quadrinhos? Há 10 anos, como parte das comemorações dos, então, 80 anos da experiência, a professora Maria Norma Maia Soares, coordenadora das Edições da Universidade Estadual Vale do Acaraú (UVA), propôs uma forma alternativa de narrar para os alunos das escolas de Sobral os acontecimentos daquele dia, que revolucionou a Ciência em todo o mundo.

Uma proposta feita ao professor Geraldo Jesuíno, então coordenador da Oficina de Quadrinhos da Universidade Federal do Ceará (UFC), da qual surgiu a HQ "Onde a Luz Fez a Curva". A obra foi desenvolvida pelos irmãos João Belo Júnior e Júlio César Filgueira Belo, então alunos da Oficina. Contou ainda com a participação direta de Geraldo Jesuíno, Walber Feijó e João Belo Júnior na fase de colorização das páginas.

Um trabalho intenso de quatro meses, desde a fase de pesquisas até a produção da obra, passando pelos desenhos, arte final e letras. O gibi contou com um material bruto de cerca de 80 páginas de roteiro, cujo processo de condensação foi difícil pela necessidade de traduzir a linguagem científica para a dos quadrinhos.

O resultado de tanto esforço veio ainda em 1999, quando a publicação venceu duas categorias do Prêmio Carbono 14, criado a partir de iniciativas do desenhista e professor de desenho Daniel Brandão. A publicação levou os troféus de Melhor Publicação e Melhor História.

"Onde a Luz Fez a Curva" teve tiragem inicial de 10 mil exemplares, mas a circulação ficou quase restrita à cidade de Sobral. Poucos gibis chegaram à capital, Fortaleza. Por ocasião da 57ª Reunião Anual da Sociedade Brasileira para o Progresso da Ciência (SBPC), na Universidade Estadual do Ceará (UECE), uma segunda edição foi distribuída aos participantes do evento.

Segundo a professora Maria Norma, uma nova fornada de 5 mil exemplares está sendo preparada e deve ficar pronta agora em junho. "Estou fazendo uma boa tiragem para tentar fazer a revista chegar a um público maior. O lançamento deve acontecer ainda em junho, mas depende do trabalho da gráfica", comenta.

A coordenadora das Edições UVA se mostra entusiasmada também com outros projetos ligados à comemoração da experiência. Neles se incluem o lançamento de um vídeo produzido pela equipe da Casa Amarela, durante a SBPC de 2005, e a idéia trazida por João Belo Júnior de uma exposição com as pranchas da HQ, que bem que poderia acontecer na recém inaugurada Gibiteca de Quadrinhos de Fortaleza.

Para elevar a autoestima do cearense

A importância da HQ "Onde a Luz Fez a Curva" para a cidade de Sobral e para todo o Ceará, como forma de divulgação da experiência científica que comprovou a Teoria de Einstein, a professora Maria Norma enxerga na contribuição para elevar a auto-estima do povo cearense.

"A gente ama aquilo que a gente conhece. Logo, é muito importante fazer chegar mais ao conhecimento dos jovens os nossos valores. Como educadora, me preocupei em saber como ensinar às crianças que um alemão criou uma teoria e o que ela significa. Daí surgiu a idéia de fazer isso em quadrinhos, porque temos que ter outras formas de fazer chegar o ensino às crianças, ensiná-las a valorizar sua terra", acrescenta.

Embora o gibi tenha como motivo a comprovação da teoria em Sobral, a trama é focada no criador da teoria. A obra funciona também como uma biografia em quadrinhos de Einstein. Conta desde o seu nascimento na cidade alemã de Ulm, em 14 de março de 1879, até o seu falecimento em 18 de abril de 1955, em Princeton (EUA), passando, é lógico, por fatos e situações que foram despertando seu interesse pela Ciência e pela elaboração de teorias científicas.

A HQ "Onde a Luz Fez a Curva" tem algumas curiosidades. Uma delas é o emprego da terceira pessoa para narrar a história. Nesse caso, o simpático Sobralito, um personagem fictício que teria presenciado a visita da expedição em sua infância. "Quando vi o boneco da revista achei que tudo estava sendo contado de forma muito direta, daí o personagem Sobralito foi criado como solução. O nome é uma homenagem a Sobral e ele representa a tradição que o povo da cidade mantém de conversa na calçada, trazer a cadeira para calçada e conversar, contar histórias", explica a professora Maria Norma.

Outro aspecto interessante pode ser visto nas apresentações, logo no início da obra. Uma delas é assinada pelo então prefeito de Sobral, Cid Gomes, que hoje é o governador do Ceará. No texto, Cid Gomes afirma que "... 'Onde a Luz Fez a Curva nos enche de orgulho quando nos mostra o lugar que nossa cidade ocupa na história científica mundial".

Sem dúvida, é mesmo para ter muito orgulho. Da experiência científica e dessa maravilhosa obra em quadrinhos, leitura obrigatória para todo aquele que ama a Nona Arte. Orgulho de Sobral. Orgulho do Ceará!

Depoimento dos criadores de Onde a Luz Fez a Curva

"A UVA contratou a Oficina de Quadrinhos da UFC para desenvolver a idéia na linguagem dos quadrinhos. O Geraldo Jesuíno, gestor da Oficina, confiou o projeto a mim e a meu irmão Júlio César. A Universidade nos forneceu um script do que deveríamos abordar. A partir daí iniciamos uma pesquisa através da leitura de livros, artigos, textos na internet.

Buscamos referências fotográficas de Albert Einstein, pessoas de sua família, referências da arquitetura dos locais onde viveu ou passou, mobília e roupas. Além disso, tivemos que tentar compreender um pouco o mecanismo das teorias para tentar expressar de forma clara ao público leitor, como por exemplo a idéia da curvatura da luz.

Fizemos um roteiro de aproximadamente 80 páginas, que precisou ser condensado para se adequar ao formato e proposta do projeto. O processo de roteirização e desenhos levou em torno de quatro meses. A colorização foi feita em aquarela e acrílica e ficou a cargo de Geraldo Jesuíno, Walber Feijó e de mim num menor número de páginas.

A idéia era falar da vida de Einstein desde seu nascimento, passando pela comprovação da Teoria da Relatividade e toda a notoriedade alcançada, atingindo o ponto alto com os experimentos realizados em Sobral e os desdobramentos posteriores até sua morte.

O curioso é que a história era narrada por um personagem fictício, que teria supostamante presenciado os acontecimentos na sua infância, e que portanto seria alguém apropriado para contar a história do eclipse. A capa foi feita por Julio Cesar e, em 1999, a revista conquistou as categorias de Melhor História e Melhor Publicação, numa premiação local de nome Carbono 14.", João Belo Júnior

"Após o contato da Universidade Vale do Acaraú (UVA) junto à Oficina de Quadrinhos da UFC, e a confirmação de nossa participação, João Belo Júnior e eu tivemos quatro meses para desenvolver o projeto.

A idéia era narrar a história da vida de Albert Einstein e enfatizar a contribuição do eclipse solar ocorrido em Sobral na comprovação da Teoria da Relatividade do ilustre físico. Foram sugeridas algumas diretrizes e fatos marcantes da vida do personagem, mas tivemos que pesquisar ainda em diversas fontes, especialmente, referências fotográficas, tanto de Einstein quanto da arquitetura e de vestimentas da época.

Também tivemos de superar a dificuldade em transportar a complexidade científica para a linguagem dos quadrinhos, de forma a garantir o acesso à teoria de Einstein. Com isso, levamos um bom tempo em mais pesquisas, reescrevendo trechos inteiros da história. A solução foi a inserção de um personagem narrador que aproximasse os leitores com a situação vivida pelos cidadãos de Sobral na época do eclipse.

Levamos dois meses para concluir o texto, incluindo aí a revisão de diálogos e a definição das páginas, a chamada decupagem. Dois outros meses foram necessários para desenhar e finalizar as páginas em formato A3. Foram trinta e cinco páginas de trabalho intenso, principalmente por se tratar de nosso primeiro trabalho profissional. A colorização, que contou com a participação de Geraldo Jesuíno, Walber Feijó e João Belo Jr, foi realizada à medida que as páginas eram concluídas.

O livro, que teve tiragem inicial de 10 mil exemplares e que recebeu o “Prêmio Carbono 14 do Quadrinho Cearense” nas categorias “Melhor Publicação de 1999” e “Melhor História de 1999”, retratou um momento histórico na comunidade científica mundial, e foi marcante no cenário quadrinhístico cearense enquanto publicação. Infelizmente, “Onde A Luz Fez A Curva” não teve grande divulgação por se tratar de um projeto destinado apenas ao público das escolas de Sobral (e não ter caráter comercial).", Júlio César Filgueira Belo

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