20 de ago. de 2014

Biografias impossíveis: escrever encontros entre artes e ciências

(Susana Dias e Carolina Cantarino - Com Ciência) Os estudos biográficos desenham retratos comuns para os encontros entre artes e ciências. Ora nos encontramos com personagens como Leonardo da Vinci, que se tornou um ícone do casamento entre artes e ciências, cujas criações remetem à ideia de híbridos de arte-ciência que revelam afinidades. Picasso e Einstein, cujas obras sugerem confluências e correspondências entre o cubismo e a teoria da relatividade e mobilizam a busca de provas de encontros reais entre os dois gênios. Também encontramos artistas que são considerados ilustradores de ciências, como Remedios Varo que produzia pinturas para livros e revistas científicas e de divulgação. Conhecemos, ainda, cientistas que desenham, pintam, tocam instrumentos, cantam etc, e as influências que tais habilidades e experiências proporcionam em suas obras. Ficamos sabendo da paixão que certos artistas têm por ciência desde a infância, como Walmor Corrêa, cujo fascínio pela biologia teria motivado suas experimentações com ferramentas e métodos científicos. Assim como temos acesso aos relatos de artistas sobre os impactos dos eventos científicos e tecnológicos em suas vidas e obras, como na autobiografia de Kandinsky, em que ele diz como se sentiu quando a possibilidade de quebra do núcleo do átomo foi anunciada pela comunidade científica: “Esta descoberta me surpreendeu com um impacto fantástico, comparável ao fim do mundo. Em um piscar de olhos, os poderosos arcos da ciência quebraram diante de mim. Todas as coisas se tornam moscas, sem força ou certeza” (Asthon, 2002, p. 15).

Entre os efeitos que a biografia produz na divulgação científica e cultural e que nos interessa problematizar, está a de capturar esse objeto “arte-ciência”. Uma captura que nos apresenta as conexões entre artes e ciências como já dadas, como sempre tendo existido , sendo a separação algo artificial, feita apenas para fins de conhecimento, fins didáticos e/ou científicos. Uma separação que marcaria o pensamento moderno e ocidental e que precisaria ser superada. Caberia à divulgação científica e cultural resgatar tais experiências e descrevê-las. Apresentar os dizeres de artistas e cientistas, de artistas-cientistas, escrever sobre suas vidas e contextos de criação. Não estariam as perspectivas biográficas, centradas na história de vida dos sujeitos e no tempo cronológico, arquivando a pergunta “o que pode o encontro entre arte e ciência?” Haveriam outros modos de escrever encontros entre artes e ciências? O que potencializariam?

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