20 de out. de 2014

Primeiro clube de astronomia amadora do Brasil, localizado em MG, completa 60 anos

Ceamig, centro de observadores amadores, chega aos 60 anos com um currículo recheado de descobertas, entre as quais a de dois cometas e de asteroides, que enriquecem a ciência




(Estado de Minas) O Centro de Estudos Astronômicos de Minas Gerais (Ceamig), considerado o primeiro clube de astronomia amadora do Brasil, completou 60 anos com uma trajetória rica em dedicação, cumplicidade e contribuição à ciência. As comemorações serão em 5 de novembro, na própria sede, que funciona no Observatório Oswaldo Nery, 11º andar do prédio do Colégio Santo Agostinho, no bairro de mesmo nome, na Região Centro-Sul de Belo Horizonte. O observatório, tido como o único da América Latina dentro de uma grande cidade, é aberto a sócios e público interessado.

Apesar do aniversário oficial de fundação do Ceamig ter sido em março, as comemorações foram transferidas para novembro, tendo em vista a disponibilidade de alguns ex-presidentes e outras personalidades que serão homenageadas, devido à luta pela manutenção e ampliação das atividades do Ceamig. O casal fundador, Maria da Conceição e Henrique Wykrota, já falecido, deverá ser representado pela família. Henrique Wykrota morreu no mês passado, aos 99 anos.

Mas um dos grandes responsáveis pelo desenvolvimento da astronomia no estado e no país, o professor universitário, farmacêutico e biólogo Bernardo Riedel, de 74 anos, que também participou da fundação do Ceamig, continua colaborando com o centro. “A astronomia amadora em Minas existe por causa do Bernardo. Todas as gerações passaram pelas mãos dele e a história do Ceamig se confunde com sua trajetória”, afirma o atual presidente do centro, Marcos Ackel.

Bernardo tinha 13 anos quando deu asas ao gosto pela astronomia. Com o casal Wykrota, participou da criação do Ceamig e nunca abandonou o hobby. Como não havia curso específico na área, formou-se em farmácia e biologia e abriu um laboratório óptico para a fabricação de telescópios e até hoje ajuda na construção dos equipamentos, já que é hábito no centro se construir o próprio telescópio.

Sem sede específica, durante um tempo o Ceamig chegou a funcionar na casa de Bernardo, no Bairro Floresta, Região Leste de BH. Passou por outras sedes até que, um dia, quando dava aulas no Colégio Santo Agostinho, ele teve uma ideia. “O prédio estava em obras para a ampliação da escola e eu ministrava aqui aulas de astronomia. Então, disse ao padre, diretor do colégio na época: ‘Quem sabe não se constrói aqui um observatório?’. Ele respondeu: ‘Você está doido?’. Mas o dono da construtora, o Oswaldo Nery, o convenceu.”

Bernardo foi convidado para ajudar na construção do observatório e parte do projeto do prédio do colégio teve que ser mudada em virtude do peso a mais que o 11º andar receberia. A cúpula, de 3,9 metros, de alumínio, teve que ser desmontada para ser levada até o local. Para rotação da cúpula – fundamental para observação das estrelas que estão em constante movimento –, foi usado um volante de Fusca. Com um robusto telescópio de 180mm de diâmetro, o observatório foi inaugurado em meados da década de 1990 e hoje é palco de estudos não só para os associados do Ceamig como para interessados na ciência e curiosos. Também no terraço do prédio são montados telescópios menores para crianças e escolas que promovem observações.

Uma visão enriquecedora
Dois cometas, 10 asteróides rasantes à Terra – os chamados NEOs (Near Earth Objects) –, 26 asteroides do Cinturão Principal do Sistema Solar (região entre os planetas Marte e Júpiter), 15 estrelas supernovas extragaláticas e três estrelas variáveis fazem parte do currículo das descobertas de astrônomos amadores que integram o Ceamig. Entre as mais recentes e de importância para a ciência, estão os cometas Sonear e Jacques, descobertos no início do ano em observatório montado próximo à cidade de Oliveira, na Região Centro-Oeste, e inaugurado no ano passado. Também está para ser confirmada a descoberta do 11º NEO, que poderá vir a ser um asteroide potencialmente perigoso, o que o tornará monitorável pelos próximos milhares de anos.

Um dos responsáveis pelas descobertas, o engenheiro e físico Cristóvão Jacques (que deu nome ao cometa avistado em março), explica que o objetivo principal de um observatório é exatamente descobrir asteroides que passam perto da Terra e identificar o risco de colisão, podendo-se tomar medidas preventivas, como evacuação de regiões sob risco. O provável 11º NEO, segundo Cristóvão, mede mais de 120 metros de diâmetro e passa no mínimo a 7,5 milhões de quilômetros da órbita da Terra. Uma provável colisão, no entanto, segundo ele, seria para daqui a centenas de milhares de anos. “Lembra aquele meteoro que caiu na Rússia em 2013 e deixou muitos feridos? Se tivesse sido previsto, a população local estaria avisada e muita coisa poderia ter sido evitada”, exemplifica.

Sobre os cometas recentemente descobertos, Cristóvão comenta a façanha: “O primeiro objeto que descobrimos em Oliveira é o mais difícil de se detectar, um cometa. E este foi o primeiro cometa descoberto em solo brasileiro por brasileiros”. Foi descoberto em janeiro e reconhecido pela União Astronômica Internacional (IAU). Levou o nome de Sonear, que é o nome do observatório de Oliveira, conforme regra da IAU, por não ter sido identificado imediatamente como um cometa pelos descobridores. O cometa Sonear passará a cerca de 420 milhões de quilômetros da Terra em setembro de 2015, mas não será visível a olho nu. Já o segundo, detectado em março, leva o sobrenome de Cristóvão (Jacques) por ter sido identificado no ato. Segundo ele, “foi o cometa mais brilhante deste ano, sendo observado e fotografado por vários astrônomos ao redor do mundo”. O telescópio usado em Oliveira, de 450mm, foi projetado e construído no Ceamig.

Oficina
Na sede do Ceamig também funciona uma oficina para a construção de telescópios, momento em que os astrônomos amadores também se transformam em artesãos. A confecção dos espelhos é uma das tarefas mais importantes e, segundo o grupo, dá mais precisão ao equipamento do que se comprado no comércio. “Se há 400 anos o pessoal fazia, por que nós também não podemos fazer?”, diz o estudante de engenharia Evalder Almeida, enquanto faz o polimento do vidro, que, depois, será espelhado, ao lado do professor de matemática Cícero Antônio, que também optou por confeccionar o próprio telescópio. O trabalho, como é feito somente aos sábados, deve durar de três a quatro meses.

Saiba mais

Aberto ao público
Os associados do Ceamig participam das reuniões aos sábados, a partir das 15h, no Observatório Oswaldo Nery, no Colégio Santo Agostinho (entrada pela Rua Aimorés, 2.735), com palestras e trocas de informação sobre astronomia, além, obviamente, da observação do céu, que vai até as 21h. Sempre um sábado por mês, as reuniões são abertas ao público e há, inclusive, atendimento a escolas. A marcação de visitas pode ser feita pelo site www.ceamig.org.br e há a possibilidade de se pedir a visita dos astrônomos amadores às escolas durante a semana. Para enriquecer as aulas, também está sendo construído um planetário dentro da sede. Calcula-se que já tenham passado pelo centro mais de 700 associados. O Ceamig é aberto à convivência de interessados e está disponível para a adesão de novos astrônomos amadores. Não há restrição de idade.

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